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Traços da Dança na Educação Básica nos anos 1970:
convênio da SECE-PE e o Grupo de Ballet do Recife
Alexsander Barbozza da Silva
Para citar este artigo:
BARBOZZA, Alexsander da Silva. Traços da Dança na
Educação Básica nos anos 1970: convênio da SECE-PE e o
Grupo de Ballet do Recife.
Urdimento
Revista de Estudos
em Artes Cênicas, Florianópolis, v. 3, n. 56, dez. 2025.
DOI: 10.5965/1414573103562025e0203
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Traços da Dança na Educação Básica nos anos 19701: convênio da SECE-PE e o Grupo de Ballet
do Recife2
Alexsander Barbozza da Silva 3
Resumo
Este estudo dançante/educativo acompanha fragmentos do convênio entre a SECE-PE e o
Grupo de Ballet do Recife na década de 1970, período da Ditadura Militar marcado por
repressão e emergência de políticas culturais. O Ballet do Recife articulou circulação nacional,
intercâmbio internacional e projetos pedagógicos voltados à aproximação da dança com
estudantes e docentes da rede pública. O convênio, embora tenha promovido difusão
artística, evidenciou limites estruturais e conceituais, situando-se mais na gica do
espetáculo do que na transformação curricular. Nesse contexto, o ensino da dança oscilava
entre institucionalização, criação e expressão.
Palavras-chave
: Dança. Recife. Educação básica. 1970. Grupo de Ballet do Recife.
Traces of Dance in Basic Education in the 1970s: SECE-PE and the Recife Ballet Company
Agreement
Abstract
This educational/dance study examines fragments of the agreement between SECE-PE and
the Recife Ballet Company in the 1970s, a period under the Military Dictatorship marked by
repression and the emergence of cultural policies. The Recife Ballet Company promoted
national circulation, international exchange, and pedagogical projects aimed at bringing dance
closer to students and teachers in public schools. Although the agreement fostered artistic
dissemination, it revealed structural and conceptual limitations, leaning more toward a
performance logic than curricular transformation. In this context, dance education oscillated
between institutionalization, creation, and expression.
Keywords
: Dance. Recife. Basic education. 1970s. Recife Ballet Company.
Rastros de la danza en la educación básica en los años 1970: convenio entre SECE-PE y el
Grupo de Ballet de Recife
Resumen
Este estudio educativo/dancístico analiza fragmentos del convenio entre SECE-PE y el Grupo
de Ballet de Recife en la década de 1970, un período marcado por la dictadura militar, la
represión y la emergencia de políticas culturales. El Grupo de Ballet de Recife promovió la
circulación nacional, el intercambio internacional y proyectos pedagógicos orientados a
acercar la danza a estudiantes y docentes de la educación pública. Aunque el convenio
fomentó la difusión artística, evidenció limitaciones estructurales y conceptuales, situándose
más en la gica del espectáculo que en la transformación curricular. En este contexto, la
enseñanza de la danza oscilaba entre institucionalización, creación y expresión.
Palabras clave
: Danza. Recife. Educación básica. Años 1970. Grupo de Ballet de Recife.
1 Revisão ortográfica, gramatical e contextual do artigo realizada por Eduardo Henrique da Silva. Graduação -
Licenciatura em Letras Português na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
2 Bolsista de Doutorado da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB). Pedido
0879/2024.
3 Doutorando e Mestrado em Dança pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Especialização em
Arte/Educação pela Faculdade Venda Nova Imigrante (FAVENI). Graduação - Licenciatura em Dança pela
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Docente substituto na Licenciatura em Dança da UFPE.
abarbozza@outlook.com
http://lattes.cnpq.br/9550386768926053 https://orcid.org/0000-0002-1264-2241
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Primeiras travessias: a ditadura militar e a cena da dança em Recife nos
anos 1970
Também faz um jogo com o tempo: embaralha, ordena e reordena
o fio da meada; põe os olhos no passado, mas mantém o outro
aberto no presente e até no futuro
(Schwarcz; Starling, 2018, p. 449).
No movimento inicial deste artigo, propomos acompanhar fragmentos do
convênio firmado entre a SECE-PE4 e o Grupo de Ballet do Recife na década de
1970, em pleno período da Ditadura Militar. Inspirados no método da cartografia
(Deleuze; Guattari, 1995; 1997; Barros; Kastrup, 2009; Escóssia; Tedesco, 2009;
Rolnik, 2011), mobilizamos a análise documental (Cellard, 2008) como instrumento
de acompanhamento dos dados em sua própria processualidade, explorando
diferentes acervos e fontes produzidas desde os anos 1970 na cidade do Recife.
Dentre esses materiais, destacamos o
Jornal Diário de Pernambuco
e o
Diário
Oficial de Pernambuco
. Para fins de organização, adotamos as siglas
JDP
para os
rastros identificados no primeiro e
JDOP
para aqueles provenientes do segundo.
Essa distinção torna mais preciso o acompanhamento da natureza e da
procedência das informações mapeadas, mantendo a leitura mais coesa e
contínua.
A partir dessas primeiras pistas, o próprio texto começa a operar
deslocamentos: ao seguir os rastros inscritos nos documentos, emerge a potência
de um movimento histórico e político que tensiona a configuração das políticas
artístico-culturais do período. Assim, o percurso em fluxo se expande para
compreender como a Dança se inscreveu, e resistiu, nos territórios educacionais e
artísticos da época, produzindo modos de existência e criação que escapavam às
lógicas hegemônicas e instituíam outras formas de viver o corpo, as artes e a
educação.
4 Naquele período, a Cultura ainda era vinculada à Secretaria de Educação do Estado de Pernambuco, por
meio da Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe) , criada em 1973, que
permaneceu até 2010. Foi apenas em 2011, no segundo mandato do governo de Eduardo Campos, que a
Secretaria de Cultura de Pernambuco (SECULT-PE) foi oficialmente instituída como pasta independente.
Disponível em:https://www.cultura.pe.gov.br/pagina/sistema-estadual-de-cultura/?utm_source=chatgpt.com. Acesso
em: 27 jul. de 2025.
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Nos anos 1960 e 1970, o Brasil encontrava-se sob a Ditadura Militar, instaurada
com o golpe de 19645 e reforçada pelos Atos Institucionais, em especial o AI-56. O
período foi marcado por repressão política, violência contra populações indígenas,
arrocho salarial e aumento do custo de vida, fatores que motivaram greves
operárias, manifestações estudantis e mobilizações de massa. Episódios como a
morte de Edson Luís (1968) e de Alexandre Vannucchi Leme (1973) reforçaram a
importância do movimento estudantil como força social significativa (Schwarcz;
Starling, 2018).
Na segunda metade da década de 1970, durante o governo do presidente
militar Ernesto Geisel (1974-1979), houve uma flexibilização parcial do controle do
regime sobre a sociedade civil, por meio do processos de “liberação”, o que
possibilitou uma maior organização de movimentos sociais, como o Feminismo7,
o Movimento Gay8 e o Movimento Negro Unificado (Avritzer; Gomes, 2013; Avritzer,
2012; Guimarães, 2009).
Essa abertura limitada se expressou também em iniciativas institucionais,
como a criação da Fundação Nacional das Artes - Funarte (Lei 6.312/1975) e o
primeiro Plano Nacional de Cultura, que buscavam dialogar com os movimentos
artísticos, ainda que sob uma política de controle da produção cultural (Matos,
2011). Essas políticas aproximavam artistas do Estado, mas também controlavam
recursos e visibilidade, funcionando como mecanismos de gestão que limitavam
a criação e obrigavam as Artes, inclusive a dança, a negociar seus espaços.
Foi nessa configuração de flexibilização parcial e de políticas culturais
5 Conforme as docentes Schwarcz e Starling (2018), antes do golpe que levou o governo ao poder em 1964, já
havia ocorrido outra tentativa de golpe de Estado, cujos responsáveis não foram punidos, criando, assim, a
percepção de que atos antidemocráticos poderiam ocorrer impunemente e que a estabilidade institucional
estava vulnerável a intervenções militares.
6 O Ato Institucional 5 (AI-5): Decreto promulgado em 13 de dezembro de 1968 durante a Ditadura Militar
no Brasil, que intensificou a repressão política ao suspender garantias constitucionais, fechar o Congresso
Nacional, censurar imprensa, proibir direitos políticos e ampliar os poderes do Executivo para reprimir
opositores do regime (Schwarcz; Starling, 2018).
7 Retomada de lideranças feministas e circulação de publicações que pautavam uma agenda política ainda
centrada em mulheres brancas das elites (Akotirene, 2020; Nascimento, 2021).
8 O engajamento na pesquisa sobre os movimentos gays na cada de 1970 no Brasil foi conduzido, em grande
parte, por pesquisadores brasileiros, majoritariamente gays, brancos, da elite e pessoas sem deficiência, que
tiveram a oportunidade de estudar no exterior. Essas vivências internacionais exerceram uma influência
direta na produção acadêmica nacional, contribuindo para a formação de um campo de estudos que
buscava articular as especificidades locais com as pautas globais dos movimentos LGBT (Green, 2022).
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emergentes que a cena da dança cênica em Recife começou a se tecer entre
corpos, gestos e encontros. Bailarinos e coreógrafos, como Flávia Barros9, carioca
que fez da cidade seu território de criação, e Mônica Japiassu, traçaram caminhos
próprios, fundando companhias que deixaram marcas nas formas de dançar e de
imaginar a arte naquele tempo (JDP e JDOP).
Ao mesmo tempo, movimentos ligados às danças tradicionais do estado
tensionam a cena em busca de maior visibilidade na esfera pública, enquanto se
fortalecia um processo de sistematização dessas práticas, voltado a registrar e
legitimar seus saberes. Nesse percurso, ganharam destaque as ações do Mestre
Nascimento dos Passos10, voltadas à valorização do Passo Frevo enquanto forma
de dança (Vicente, 2007), e de Mestre Zumby Bahia, que impulsionou algumas das
primeiras articulações da dança negra recifense (JDOP).
Entre as iniciativas do período, o Ballet de Flávia Barros ganha destaque pelos
festivais promovidos no início dos anos 1970 e pela circulação regional que ajudou
a dinamizar a cena local. Em 1972, Barros e Ruth Rozenbaum criam o Grupo Ballet
do Recife, companhia que rapidamente alcançou projeção nacional e amplia o
alcance das ações formativas e artísticas desenvolvidas na cidade (JDP e JDOP).
A partir de 1973, o repertório do grupo se expande, incorporando elementos
da dança moderna e referências folclóricas. Embora o balé clássico permaneça
central, surgem registros de Barros dançando frevo e coordenando ações com
caboclinhos e maracatu, aproximando-se, ainda que por um olhar externo, das
práticas culturais pernambucanas (JDP). Além de formar bailarinos, Barros e
Rozenbaum impulsionam o intercâmbio artístico internacional em Recife,
promovendo a vinda de artistas de renome à cidade.
Nessa dobra do caminho, Flávia Barros representou Pernambuco no Encontro
das Escolas de Dança do Brasil desde 1962, retornou em 1963 e, em 1973, participou
9 Para maior detalhamento da biografia desta artista, ler o livro
Flávia Barros
, de Arnaldo Siqueira (2004).
10 O Mestre Nascimento do Passo, cujo nome de batismo é Francisco do Nascimento Filho, nasceu em 28 de
dezembro de 1936, em Benjamin Constant, no Amazonas, e chegou ao Recife em 1949, escondido no porão
do navio Almirante Alexandrino. Após trabalhar como engraxate e carregador de fretes, aproximou-se do
Clube Vassourinhas, onde despertou seu interesse e amor pelo frevo. Reconhecido por sua relevância na
dança, criou a primeira metodologia estruturada para o ensino do frevo, formando centenas de passistas e
divulgando essa tradição no Brasil e internacionalmente.
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da terceira edição, realizada em Campina Grande (PB), acompanhada pelo Grupo
Ballet do Recife. Organizado por Paschoal Carlos Magno11, o Encontro reuniu
representantes de vários estados para troca de experiências e integração da
produção coreográfica nacional, evidenciando o crescente protagonismo de Recife
na cena da dança (JDP).
Esse protagonismo se fortaleceu no mesmo período em que as políticas
culturais de Pernambuco ganharam maior estruturação, especialmente após a
criação da Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco
(Fundarpe), em 1973, voltada à preservação, ao fomento e à difusão das Artes no
estado. Dois anos depois, a chegada de Ariano Suassuna à SEC-PE impulsionou
ainda mais esse processo, com a criação do Balé Armorial do Nordeste (BAN),
vinculado ao Movimento Armorial12 e dirigido por Flávia Barros, em articulação com
Carmita Guimarães e Ruth Rozenbaum (JDP e JDOP).
Formado gradualmente, o BAN estreou em 1976 no Teatro Santa Isabel com
o espetáculo
Balé Armorial do Nordeste: iniciação armorial aos mistérios do boi de
Afogados
, que atraiu grande público, circulou pelo Rio de Janeiro e foi exibido na
TV Educativa por meio de articulações da Fundarpe e do MEC (JDP e JDOP). Esses
movimentos sugerem que a transposição das danças populares para o palco
ampliou seu reconhecimento institucional, mas também apagou referências
negras e indígenas, reforçando padrões eurocêntricos e hierarquias culturais.
O Balé Armorial encerrou suas atividades pouco após a estreia, mas deixou
desdobramentos importantes na cena local, como a criação do Balé Popular do
Recife (1977) e, mais tarde, do Grupo Grial de Dança (1997) (Marques, 2008). Flávia
Barros seguiu à frente do Ballet do Recife até seu encerramento em 1978,
11 Paschoal Carlos Magno foi diplomata de carreira, tendo atuado no serviço exterior brasileiro entre as décadas
de 1930 e 1960, exercendo inclusive o cargo de embaixador do Brasil. Destacou-se também como um dos
principais incentivadores culturais do país no século XX, atuando na promoção do teatro, da literatura e da
dança. Foi responsável pela criação e organização de diversos festivais e encontros artísticos e contribuiu,
em 1970, na esfera federal, para a proposta de separação do Ministério da Cultura, então vinculado ao
Ministério da Educação. Disponível em: <https://atom.funarte.gov.br/index.php/colecao-paschoal-carlos-
magno>. Acesso em: 27 jul. de 2025.
12 Para a docente Roberta Ramos Marques (2008, p. 13): “O Movimento Armorial tem como fim criar uma arte
brasileira erudita com base na cultura popular nordestina com “raízes” africana, indígena, ibérica e moura,
e, com isto, fortalecer a ideia de uma “identidade cultural brasileira”. O mentor deste projeto estético é o
escritor Ariano Suassuna, que oficializou o movimento no ano de 1970. Antes disso, porém, artistas de vários
domínios artísticos já estavam afinados com a proposta armorial”.
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consolidando sua trajetória e influência na dança recifense, ao mesmo tempo em
que evidenciava as tensões entre memória cultural, institucionalização e
valorização de diferentes corpos e saberes (JDOP).
Nesse mesmo período de consolidação da cena artística local, o
fortalecimento institucional da cultura recifense abriu novas possibilidades: em
1979, a Lei 13.535 criou a Fundação de Cultura do Recife (FCCR) e a Obras Recife,
com autonomia para promover a cultura popular e preservar a memória local.
Essas iniciativas favoreceram a expressão negra na cidade, como os grupos de
capoeira e dança de Zumby Bahia, a estreia de
Ânsia de Liberdade
(1980) e, em
1981, a fundação do Balé Primitivo de Arte Negra de Pernambuco, vencedor do
Troféu de Ouro no XIII Festival del Lago Ypacaraí (1983), no Paraguai (JDP e JDOP).
As pistas acerca da cena da dança, expostas acima, mostram como essas
paisagens configuram modos de existência, circulação e disputa no campo da
dança. Articulada à segunda Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDBN), de 1971, essa abertura possibilitou que práticas artísticas, mesmo fora da
estrutura formal de disciplinas, fossem incorporadas às atividades escolares e à
vivência dos estudantes, ampliando os modos pelos quais a dança se insinuava no
cotidiano educativo.
Nesse movimento de aproximação entre Dança e Educação Básica, emergem
iniciativas que tensionam os contornos do que se podia viver como experiência
artística no cotidiano escolar. Entre essas ações, ganham relevo os convênios
firmados pela Secretaria de Educação e de Cultura de Pernambuco (SECE-PE) com
companhias de dança. A seguir, acompanhamos fragmentos do convênio com o
Grupo de Ballet do Recife e alguns de seus desdobramentos.
Fragmentos do convênio entre a SECE-PE e o Grupo de Ballet do Recife:
Aproximações da Dança na Educação Básica
No território da educação brasileira, os contornos das políticas públicas se
reorganizaram sob a Ditadura Militar, delineando fluxos influenciados por
tendências neoliberais e tecnicistas, alinhadas à lógica do capitalismo mundial
hegemônico e marcada por uma matriz eurocêntrica e colonial/moderna (Quijano,
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2010).
Nesse mapa, a Educação foi instrumentalizada como rota para a expansão
econômica do país (Cunha; Góes, 2022), ao mesmo tempo em que o governo
militar traçava linhas de docilização social, de modo que: “[...] a escola foi usada
para divulgar valores desejáveis e manter a sociedade pacífica” (Jacomeli, 2010, p.
77).
Dentro desse percurso, emergem instrumentos normativos que formalizam tais
trajetórias. A Lei 5.692, de 9 de agosto de 1971, reformulou o ensino de e
graus no país e determinou que: “Será obrigatória a inclusão de Educação Moral e
Cívica, Educação Física, Educação Artística e Programas de Saúde nos currículos
plenos dos estabelecimentos de 1º e 2º grau” (Brasil, 1971, p. 3).
Sobre o conceito de Educação Artística, os docentes Silva e Araújo (2010, p.
10) observam que se trata de “[...] uma terminologia ultrapassada para o período
em que foi criada, diante dos avanços possibilitados pelos diferentes estudos e
discussões das área das Artes e seu ensino, desenvolvidos no Brasil, Estados
Unidos e Europa”.
Nessa trilha de pensamento, os autores apontam que a inserção da Educação
Artística na escola produziu uma cisão no currículo: de um lado, as disciplinas com
objetivos, conteúdos e métodos definidos; de outro, atividades voltadas apenas a
práticas e procedimentos. Nesse arranjo, as Artes foram relegadas a um lugar
complementar e funcional, o que fragilizou seu ensino e reduziu seu potencial
formativo e crítico.
Mesmo assim, a LDBN de 1971, ao oficializar a Educação Artística, impulsionou
a busca por novas estratégias de formação docente. É nesse movimento que
começam a emergir experiências formativas interessadas em articular Artes e
Educação Básica, abrindo pistas para modos de ensinar que escapavam à simples
adaptação curricular.
Destacam-se, nesse processo, iniciativas como o Curso Intensivo de Arte na
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Educação (CIAE)13, oferecido pela Escolinha de Arte do Brasil (EAB)14 a partir
de 1961, no Rio de Janeiro e, em Salvador, o Curso de Magistério Superior em
Dança, correspondente à Licenciatura, ofertado pela Escola de Dança da
Universidade Federal da Bahia (UFBA) (Robatto, 2002; Silva; Silva; Junior, 2016). Este
último se inscreve como iniciativa pioneira, pois, mesmo situado em uma dinâmica
de polivalência, já oferecia formação específica na área da Dança.
Um dos primeiros esforços para ampliar a formação docente exigida pela
nova legislação partiu do próprio Ministério da Educação (MEC), que firmou, ainda
em 1971, um convênio com a EAB. O objetivo era formar técnicos das Secretarias
de Educação e orientar a implementação da nova disciplina nas redes de ensino
(Barbosa, 2008).
Nesse fluxo, em 1974, o
Jornal Arte&Educação
, produzido pela EAB, publicou
o currículo da Licenciatura em Educação Artística, aprovado em 197315, estruturado
em uma habilitação geral (comum ou curta) e em habilitações específicas: Artes
Plásticas, Artes Cênicas (Dança e Teatro), Música e Desenho (Miranda, 2009).
A habilitação geral, voltada às grandes áreas da Arte, previa 1.500 horas,
podendo ser concluída entre um ano e meio e quatro anos letivos. Seus
componentes curriculares incluíam: (1) Fundamentos da Expressão e da
Comunicação Humana, (2) Estética e História da Arte, (3) Folclore Brasileiro, e, (4)
Formas de Expressão e Comunicação Artística, compondo uma proposta que
buscava integrar saberes artísticos e culturais. Já a formação específica totalizava
2.500 horas (sendo 1.000 dedicadas à parte específica).
13 O CIAE tinha como objetivo formar em Arte, compreendendo os processos didático-metodológicos das
linguagens artísticas e superando o modelo tradicional baseado em conhecimentos pré-estabelecidos.
Iniciado no ano seguinte, o curso foi realizado anualmente por vinte anos, a1981, dividido em dois módulos:
um para iniciantes no primeiro semestre e outro para aprofundamento no segundo. Ao longo desse período,
formou cerca de 1.200 arte-educadores brasileiros e estrangeiros, provenientes de diversas regiões do Brasil
e países como Argentina, Uruguai, Chile, Paraguai, Peru, Venezuela, Honduras, Panamá, Portugal, França e
Israel (Azevedo, 2001; Silva; Silva; Silva Junior, 2016).
14 Criada em 1948 no Rio de Janeiro, a Escolinha de Arte do Brasil (EAB) é uma instituição não formal idealizada
por Augusto Rodrigues, Lúcia Valentim e Margaret Spencer, influenciada por Herbert Read e Viktor
Lowenfeld, defensores da Educação através da Arte. Mais tarde, originou o Movimento Escolinhas de Arte,
com mais de 140 unidades no Brasil e no exterior (Azevedo, 2001).
15 Considerando a ausência das matrizes curriculares originárias, essa pista documental, evidenciada no jornal,
emerge como um indício que pode orientar a compreensão da estrutura da Licenciatura em Educação
Artística, seja na formação plena, seja nas distintas habilitações.
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Em Pernambuco, esse percurso formativo começou a ganhar corpo em 1976,
com a criação da Licenciatura Curta em Educação Artística na Universidade
Federal de Pernambuco (UFPE), campus Recife, durante a gestão do Reitor Paulo
Frederico do Rego Maciel (JDP). É apenas em 1978 que se desdobram as
habilitações específicas em Desenho, Artes Cênicas e Artes Plásticas (JDP),
delineando, gradualmente, um campo de formação artística em interlocução com
as dinâmicas locais e os contornos das políticas educacionais em escala nacional.
Essas habilitações permaneceram ativas até 2010, quando novos arranjos
curriculares passaram a configurar a formação docente na UFPE: a partir das
Licenciaturas em Dança e em Teatro.
A UFPE manteve-se, assim, como a única instituição em Pernambuco a
formar licenciados em Educação Artística e, atualmente, em Dança, consolidando
seu papel central na formação de docentes. No entanto, apesar de seu valor
simbólico, a concentração dessa formação em uma única instituição limita o
número de profissionais qualificados para a Educação Básica.
Em muitos casos, essa limitação levou à atuação de docentes não formados
na área para ministrar o componente de Educação Artística, evidenciando que a
força simbólica da UFPE não garantiu acesso equitativo ao ensino de Artes. Esse
cenário reforça a necessidade de ampliar a formação docente e de assegurar a
presença de profissionais da área nas escolas do Recife, algo que vem mudando
paulatinamente.
Nesse cenário de expansão da formação artística e de implementação da
Educação Artística na Educação Básica, consolidaram-se parcerias entre grupos
de dança e o poder público. No Recife, companhias como a de Mônica Japiassú e
o Grupo de Ballet do Recife firmaram os primeiros convênios com a Secretaria de
Educação e Cultura de Pernambuco (SECE-PE) ao longo da década de 1970,
especialmente durante as gestões de Eraldo Gueiros Leite (1971–1975) e José
Francisco de Moura Cavalcanti (1975–1979) (JDP e JDOP).
Essas iniciativas abriram novos caminhos de aproximação entre a Dança e o
espaço escolar, ampliando o contato dos estudantes com os processos de ensino-
aprendizagem dessa linguagem artística. A imagem apresentada a seguir funciona
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como nossa mola propulsora, acionando os primeiros movimentos de análise
sobre o convênio estabelecido entre a SECE-PE e o Grupo Ballet do Recife.
Figura 1 - Reportagem da renovação do convênio da Secretaria com o
Grupo de Ballet do Recife. Jornal Diário de Pernambuco (13-05-1974).
O convênio entre a SECE-PE, representada pelo Prof. Humberto Vasconcelos
(chefe de gabinete da Educação), e o Grupo de Ballet do Recife, mediado pelas
docentes Flávia Barros e Ruth Rozenbaum, concretizou-se por meio de palestras-
aula e espetáculos-aula voltados a estudantes do e graus, bem como a
professores da rede pública estadual (JDP e JDOP).
Diante da insuficiência de docentes com formação específica, tanto antes da
criação quanto mesmo com a existência do curso de Educação Artística na UFPE,
o convênio emerge como uma política de garantir a presença da Dança na
Educação Básica, atrelado a uma tentativa de formação docente.
A partir dos rastros deixados pelo projeto de 1976 (JDOP), delineia-se um
modelo de ação mais estruturado, que será detalhado adiante. As evidências
disponíveis indicam que formatos semelhantes vinham sendo experimentados
nos anos de 1973 e 1974, ainda que de modo menos sistematizado (JDP).
Tudo leva a crer que houve certa continuidade entre as iniciativas realizadas
nesse período, ainda que com ajustes na gestão e nos formatos adotados. Consta,
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portanto, a realização de edições entre 1973 e 1976; contudo, não há registros que
confirmem a execução do projeto em 1975, o que evidencia uma lacuna tanto
documental quanto institucional nesse intervalo.
Nas linhas traçadas em 1973, evidencia-se a consolidação de um convênio
que alcançou estudantes do Instituto de Educação de Pernambuco e dos Colégios
Estaduais Almirante Soares Dutra, Santa Maria, São Luiz e Torres (JDP). No ano
seguinte, entre maio e junho de 1974, professores atuaram como mediadores de
palestras junto às turmas em que lecionaram, mobilizando materiais produzidos
pelo grupo: fotografias, slides, cartazes, textos e folhetos. Essas ações indicam que
havia, naquele momento, um processo formativo previamente instaurado (JDP).
Em agosto daquele mesmo ano, as ações se ampliaram: estudantes foram
conduzidos ao teatro, abrangendo escolas de e graus, entre elas Marcelino
Champion, Oliveira Lima, José Maria, Joaquim Távora e o Colégio Evangélico Agnes
Erskine, o que confirma a continuidade e o fortalecimento da parceria entre as
companhias de dança e a Secretaria de Educação (JDP e JDOP).
Esse movimento ganhou forma mais estruturada em 1976, com o convênio
formalizado pela Instrução 16/1976 (JDOP). A proposta previa a realização de
dezoito espetáculos-aula no Teatro Santa Isabel, ao longo do segundo semestre,
cada um com duração aproximada de 60 minutos e composto por três números
de balé: clássico, moderno e folclórico (com destaque para as danças tradicionais
de Pernambuco) (JDOP).
As apresentações contavam com a participação de, no mínimo, duas
companhias e assumiam caráter didático, integrando explicações orais realizadas
pelos próprios bailarinos, com o propósito de contextualizar e aproximar os
estudantes dos elementos técnicos, estéticos e artísticos da dança (JDOP).
Paralelamente, foram realizadas palestras-aula no Centro Interescolar Luiz
Delgado, com duração mínima de quatro horas, voltadas a professores da rede
pública (JDP). Essas formações ofereciam embasamento teórico sobre dança,
ritmo, movimento, expressão corporal, música e “ballet”, buscando subsidiar
pedagogicamente os docentes na mediação com os estudantes. Nessa linha de
força, o Grupo de Ballet do Recife ensaiava uma proposta pedagógica que integrava
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a atividade artística ao cotidiano escolar e ampliava as formas de recepção estética
no espaço da escola pública.
A seleção das unidades escolares participantes era definida pelos
Departamentos Regionais de Educação, que também delineavam os percursos das
professoras nas palestras. Esses departamentos funcionavam como pontos de
articulação, garantindo presenças, acompanhando fluxos e moldando a
experiência em diferentes escalas da gestão. Ao final do percurso, os relatórios
avaliativos eram encaminhados à Diretoria de Serviços Educacionais, registrando
os efeitos da ação, ainda que sem assegurar sua continuidade ou incorporação
plena nas práticas escolares (JDOP).
Nesse plano de composição, o convênio entre o Grupo de Ballet do Recife e
a Secretaria de Educação configurou-se como uma ação ambígua: ao mesmo
tempo em que representou um esforço pioneiro de aproximação da Dança à
escola pública, também revelou os limites estruturais e formativos do período. A
proposta, ainda que inovadora em seu intento de articular Arte e Educação Básica,
permanecia vinculada a uma lógica de difusão cultural mais do que de
transformação curricular, evidenciando tensões entre a dimensão artística e a
pedagógica, entre a política de eventos e a política de formação docente
continuada.
Nessa mesma direção, mas em outro registro de atuação, o I Festival de
Dança Folclórica Nordestina, promovido pelo Departamento de Cultura (DEC) da
SEC-PE, sob coordenação de Leonardo Dantas Silva, entre os dias 18 e 22 de
agosto de 1976, no Teatro do Parque, também expressava o interesse estatal em
promover a cultura e a sensibilização artística nas escolas (JDP e JDOP).
Nos primeiros dias, o evento contou com apresentações de grupos como
Dança de São Gonçalo de Ibimirim, Caboclinho dos Candidés, indígenas da Serra
de Ororubá, Reisado de Viçosa (AL), Grupo Folclórico da UFPB, Tabuinhas de Vitória
de Santo Antão e Xangô de Pai Edu. Para o dia 22, foram programadas
apresentações de quatro escolas, cujas inscrições haviam sido abertas no mês de
julho (JDP e JDOP).
No ano seguinte, o II Festival ampliou o escopo das ações, incluindo, além
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das apresentações artísticas, atividades de formação voltadas a docentes do
componente de Educação Artística, reafirmando o interesse em articular o fazer
artístico à prática pedagógica. Entretanto, esse conjunto de iniciativas revela
políticas culturais ainda centradas em eventos e circulação de saberes, sem gerar
mudanças efetivas na formação docente ou no currículo (JDP).
É justamente nesse ponto que ganha relevância o Curso de Dança na
Educação, promovido pela Escolinha de Arte do Recife (EAR)16 em 1975, sob
mediação da artista-docente Maria Fux. A proposta, ancorada na exploração
criativa do movimento como forma de expressão, criação e comunicação
(Barbozza, 2025), apontava para outra direção: um modo de ensinar dança mais
próximo de um projeto formativo comprometido com a emancipação sensível e
com a densidade da experiência estética.
Percebe-se, assim, um certo desalinhamento entre as ações do convênio
estabelecido entre a SECE-PE e o Grupo de Ballet do Recife e as proposições
filosóficas cultivadas pela EAR. Enquanto o primeiro se aproximava de uma lógica
de difusão e espetáculo, a segunda ancorava-se nas práticas e valores
disseminados pelo Movimento Escolinhas de Arte (MEA), que defendia uma
educação artística centrada na expressão sensível e na experiência criadora
(Azevedo, 2001; Silva; Araújo, 2010).
Essa tensão entre projetos e modos de pensar o Ensino da Dança reflete não
apenas diferentes concepções pedagógicas, mas também distintos modos de
conceber o papel da arte na escola e na formação humana. Ao confrontar essas
perspectivas, evidenciam-se disputas de sentido que atravessam tanto o currículo
quanto a própria compreensão do lugar da dança no processo educativo.
Em meio a essas disputas de sentido e de direção formativa, outro rastro que
contribui para compreender o período é a formação de docentes de Educação
Artística realizada em 1975, centrada na temática da Festa Junina e conduzida por
Jurandir Ferreira. Nessa proposta, orientava-se tecnicamente a elaboração e
execução de quadrilhas juninas, tomando as apresentações artísticas como
16 Criada em 1953 por Dona Noêmia Varela (19172016) e Ulisses Pernambuco (18921943), a Escolinha de Arte
do Recife (EAR) foi uma das primeiras instituições não formais a projetar o Ensino de Arte nas escolas de
Recife, sendo também pioneira no debate sobre Arte e deficiência (Moura, 2020).
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recurso pedagógico para o Ensino da Dança e enfatizando a estrutura dos
movimentos, a sincronização coletiva e os aspectos rítmicos dessa manifestação
cultural.
Essas iniciativas, embora relevantes em seu esforço de valorização das
tradições populares, sugerem que o Ensino da Dança na Educação Básica, naquele
contexto, permanecia atrelado a uma perspectiva fortemente ao ensino de
repertório das Danças Populares e performativas. Mediadas por companhias e
grupos artísticos, essas ações ainda se inscreviam mais na lógica da difusão
cultural do que na de formação docente, pouco articuladas a um debate
pedagógico mais amplo sobre a dança como livre expressão.
É justamente nesse ponto que a docente Isabel Marques (2012, p. 22) tensiona
a discussão ao lembrar que “aprender repertório não é, de forma alguma, ‘errado’,
mas representa uma maneira bastante limitada e limitante de trabalhar a dança
no contexto escolar”. Restringir o ensino de dança à reprodução de passos e
coreografias por meio de exercícios técnicos, portanto, empobrece o campo e
invisibiliza as dimensões sociais e políticas que atravessam essa prática artística.
Ainda assim, essa perspectiva permanece presente nas escolas, especialmente
nas festividades do calendário escolar.
Nesse movimento de análise, outra vertente que compôs historicamente o
ensino de dança na escola diz respeito à ideia de livre expressão. No que se refere
a esse entendimento, Marques (2007, p. 146-147) pontua:
Este eixo pedagógico veio a reforçar as ideias modernistas sobre arte/dança
da criança, tendo gerado e generalizado a crença no que hoje chamamos de
“espontaneísmo". Ou seja, mesmo existindo o saber, ou os conteúdos, ele acaba
sendo negado e suprimido por muitos professores em contexto escolar com o
propósito de o interferir no processo de criação supostamente natural” do
aluno.
A partir dessa citação, a autora evidencia que o “espontaneísmo”, ao
pressupor uma criação infantil “natural”, leva muitos professores a negar os
saberes da dança e a esvaziar a importância da mediação pedagógica. Embora
distinto da lógica da reprodução de repertórios técnicos, esse eixo produz uma
redução semelhante: limita o Ensino da Dança ao improviso ou ao passo, sem
considerar suas dimensões culturais, estéticas e políticas. Ao tensionar esses dois
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extremos, a autora aponta para a necessidade de um ensino que articule
conhecimento, intencionalidade e experiências capazes de ampliar as formas de
criar e de perceber a dança no contexto escolar.
Nos anos 1970, a Dança em Recife se move
entre políticas de controle e iniciativas de criação.
O Ballet do Recife e o convênio com a SECE-PE aproximam a Dança da escola,
mas ainda em moldes técnicos e de difusão cultural, mais espetáculo que formação.
Flávia Barros, Ruth Rozenbaum e outros bailarinos tentam abrir caminhos:
incorporam folclore, frevo e dança moderna, promovendo intercâmbio e visibilidade.
Paralelamente, escolas e cursos, como a Escolinha de Arte do Recife, exploram o
corpo como experiência sensível,
um Ensino da Dança mais próximo da criação que da mera execução.
Entre convênios, festivais e formações, percebe-se o conflito:
a dança é instrumento de cultura oficial ou gesto de invenção e crítica?
O registro documental revela presença e estrutura,
mas também limitações:
a formação docente ainda é escassa, a valorização de corpos e saberes diversos,
parcial.
Mesmo assim, a Dança persiste, tensionando normas, atravessando espaços escolares
e abrindo fissuras para novas pedagogias do sensível.
(
Nota em movimento
)17
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n. 1, 2013. Disponível em: https://dados.iesp.uerj.br/artigos/?id=933. Acesso em: 27 jul. de
2025.
17 Por estarmos implicados numa prática de investigação, compreendemos que as considerações não se
restringem a um momento final ou a uma seção específica do texto. Ao contrário, elas se fazem presentes
ao longo do próprio processo de escrita, nos atravessamentos, desvios e retomadas que vão compondo o
percurso investigativo. Deste modo, optamos pela construção da Nota em movimento, justamente por
entendê-la como um gesto que acompanha o pensamento em fluxo, atento às intensidades que emergem
no ato de pesquisar, escrever e se implicar com o campo. Não se trata de uma conclusão, mas de uma
dobra que mantém a escrita aberta ao que ainda pulsa.
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Programa de Pós-Graduação em Teatro
PPGT
Centro de Arte CEART
Urdimento
Revista de Estudos em Artes Cênicas
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